“As ideias nunca morrem. Para bem ou para mal, é assim. Os homens passam. Frustrados ou contentes. Num caso e noutro, com razão ou sem ela. Mas as ideias duram. Independentes dos semeadores. Caminhando fortes a criar adeptos. Torturadas e presas, à espera de outro tempo. Mas vivas. Para sempre. Por vezes levam séculos de clandestinidade. Ou de silenciosa clausura. Pacientes na espera. Tenazes na busca. Firmes no propósito. A ver passar outras ideias. Com gente a morrer por elas. Ou por causa delas. Os homens transitórios. Vencidos pela natureza provisória. A fazer projectos sem medida. Mas com o tempo medido. Partindo sempre antes. A acção em meio. Ou mal começada. Ou simplesmente projectada. Ou mal sonhada ainda. Tudo um pouco além da mão estendida. Faltando um esforço. Pequeno embora. Um passo curto. O toque dos dedos. Mas impossível. Nem mais um passo, nem mais um esforço, nem mais um toque. Porque a vida falta. O provisório manda. E não faz inventários. Não concede prazos. Não dá adiamentos. Fica porém o projecto. A ideia. O espólio. A presença constante. Indestrutível. Desafiando. Indiferente à força. À espera e sem pressa. Porque toda a força cansa. Indiferente às censuras. Porque um dia virá. Nem cedo nem tarde. É sempre o momento. Para um bem e para o mal. A ideia nascida já não morre. Haverá uma brecha. Larga bastante para que passe. Haverá um homem nascido para ela. Alargando assim o transitório. E outro, e mais outro. De alma em alma. Encontrando o companheiro de tempos a tempos. Vozes que sopram e alguém escutará. Falando aos simples. Escolhendo quem não espera. Prontas para o encontro. Para novo achamento. Como as ilhas perdidas no mar e a espera. Os caminhos abertos para o veleiro de um dia. Faltando só que se dissipem as brumas. Que as madrugadas cheguem. A hora boa para encetar a caminhada. Um novo troço do caminho. Em força ou lentamente. Para de novo esperar, se necessário. Mas sempre o caminho. Depois das longas noites. Vivas e à espera. Indestrutíveis. Pacientes. Para além de todos os transitórios. Seguras. Prontas para e inevitável madrugada.” Tempo de Vésperas, MOREIRA, Adriano, Editorial Notícias.
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