sábado, 27 de dezembro de 2008

...2008, crise e oportunidade...

O que aconteceu em 2008 é o resultado de um processo de longa duração que começou a ganhar contornos precisos a partir do fim da chamada Guerra Fria, com o colapso da União Soviética e com a afirmação do Estados Unidos como a única super-potência político-militar do mundo mas que não o consegue ser a nível económico.
A emergência de novas potências económicas das quais se destacam – embora de forma distinta – a China, a Índia e o Brasil, o disparo do consumo e da procura de energias fósseis num cenário de crescente escassez, a que esteve associado um período de prosperidade económica e baixa inflação que conduziu a um boom de crédito barato, provocou um cenário propício à crise, que devido à globalização, contaminou todo o planeta.
O hiper-consumo, associado ao recurso desmesurado ao crédito, agravado com a ausência de qualquer regulação eficaz dos mercados de capitais, desenvolveu uma série de bolhas – do imobiliário às participações de índole tecnológica, passando pelas “bonds” – que a natural falta de liquidez fez rebentar e cujos efeitos ainda estão para ser quer cabalmente sentidos e avaliados com rigor.
Dois mil e oito não foi, como muitos agora pensam e apregoam, o canto do cisne do capitalismo e muito menos a redenção das teses marxistas-leninistas. Desenganem-se, o capitalismo está para durar e o marxismo-leninismo é passado de má memória. O que aconteceu é que, finalmente, se percebeu que o capitalismo – autofágico por definição e na sua essência – precisa de ser regulado e de funcionar assente em produção real e consumo moderado.
O capitalismo neo-liberal revelou-se altamente tóxico e os seus defensores uns irresponsáveis e desconhecedores da realidade.
Esta crise teve – tem – o mérito de nos permitir introduzir bom senso no funcionamento sistémico. Bom senso cuja introdução cabe, nesta primeira fase, aos Estados, já que são as únicas instituições capazes de introduzir normas de conduta operativa. Essas normas de conduta operativa não significam nem controle absoluto nem substituição – ninguém acredita numa economia estatizada -, mas sim o assumir da responsabilidade única pelo bom funcionamento do sistema em interacção directa com os demais Estados ou blocos de Estados.
Esta crise pode ser uma excelente oportunidade. Uma oportunidade de aportar justiça social ao sistema, uma oportunidade para o real desenvolvimento de fontes energéticas alternativas e uma oportunidade de aportar novos parceiros à partilha das macro-decisões planetárias. Já não faz qualquer sentido um planeta governado em petit comité pelos Estados Unidos, pelo Japão, pela Grã Bretanha, pela França e pela Alemanha. Hoje em dia a China, a Índia, o Brasil, a Rússia, a África do Sul, a Austrália, transformaram-se em players incontornáveis. Incontornáveis e que não abdicam desse mesmo estatuto.
Cabe, em primeira mão, aos Estados Unidos da América perceber isso, sob pena da naturalidade das circunstâncias o ditarem e isolarem a América. A Europa, neste cenário multipolar – a que alguns já se referem como “apolar” – tem um sério problema para resolver. Um problema político, um problema económico e um problema social. Ou se reformula e se torna credível para os próprios países que constituem a Europa e assim fazendo perante os demais, ou tornar-se-á cada vez mais periférica no grande palco mundial das decisões
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