sábado, 29 de março de 2008

...são domingos..





O Alentejo está a renascer. Água, campos cultivados, património valorizado e gente. Gente nova.
Nesse Alentejo que renasce há uma espécie de paradoxo que merece ser visitado. Um recanto. Um recanto que é mais um complexo. O antigo complexo mineiro de São Domingos, entre Serpa e Mértola.
Ruínas de um passado cheio de vida a fazer a vida nas entranhas da terra. Ruínas de ferro feito ferrugem, de águas contaminadas por químicos fruta-cores. Casas, armazéns e fábricas invadidas por heras e árvores. Um silêncio profundo em que nem os fantasmas se escutam. E há fantasmas. Muitos, Fantasmas de mineiros, de capatazes e directores. Suores misturados num rio-sonho que secou. De São Domingos ao Pomarão - onde há mais de cem anos mais de quinhentos barcos por ano se engravidavam de minério para irem parir a Inglaterra, sulcando o Guadiana e navegando o Atlântico – um passado feito de muita gente se esvai na poeira cor de cobre.
Ao ver-se sente-se uma ponte entre a tristeza e a melancolia. Um fim ditado por uma parte da natureza que se esgotou. E esgotando-se, os homens partiram e só restam nas fotografias amareladas pelo tempo. Testemunhos de um anonimato que riu, chorou, suou e amou antanho.
Vale a pena ir a São Domingos – a estalagem é excelente – e andar meio perdido nas picadas e perceber como tudo é um ápice. Neste caso, um ápice que se revela de forma oxidada, como se naquela ferrugem que consome o ferro se pudesse ler, com todas as letras, que o tempo é uma esponja.


Vale a pena ir a São Domingos...

2 comentários:

Unknown disse...

Há muito tempo que não lia uma descrição assim!...

S. Domingos... Não esquecerei.
Nem o sítio, nem as tuas palavras.

[Beijo de regresso...]

mdsol disse...

o texto é muito bonito...

:))