Ontem, à porta do Rivoli, no momento da estreia do espectáculo “Jesus Cristo Superstar”, encenado por La Feria, entre as 20.30 h e as 21.30h, decorreu um protesto participado por centenas e centenas de pessoas ligadas ao teatro e demais áreas da cultura.
As causas do protesto são sobejamente reconhecidas: a contestação e a revolta perante o processo de concessão do Teatro Municipal Rivoli.
Formando uma verdadeira moldura humana, os “protestantes”, empunhando pequenos cartazes com a letra “R” (R de Rivoli e de Revolta), em silêncio, assistiram à entrada das autoridades municipais e dos convidados para a estreia.
Esses, os convidados – eles de smoking ou fato escuro, elas de vestido de toilete – passavam e entravam com uma expressão no olhar própria daqueles que olham mas não querem ver.
Já há muito tempo que não via tanto smoking alugado. Já há muito tempo que não via um desfile que revela aquilo que o Porto tem de pior: uma burguesia provinciana, de génese vinhateira ou com origem em merceeiros ou prestamistas enriquecidos.
Estas pseudo elites, que transformaram o Porto naquilo que é hoje: uma cidade irrelevante, amorfa, acomodada, condenada a ser um deserto urbano, que é em si mesmo um paradoxo. O Porto é hoje um paradoxo.
Estas pseudo elites, que o senhor La Feria rapidamente psico-radiografou, são as mesmas que sentadas nos conselhos de administração dos bancos, no parlamento, nas direcções-gerais, todas em Lisboa, num ápice aprenderam a falar “lisbonês” com sotaque parvo-cascaeinse, estão-se nas tintas para a cidade e para a região que pertencem.
São os mesmo que por um convitezinho vendem a alma, são os mesmos que pela possibilidade calcorrearem um tapete vermelho – mesmo que estafado e colocado em lajedo de província – engolem em seco o ar da pouca decência que lhes resta.
São os coveiros do Porto.
Mas o Porto ainda tem quem levante um “R”. Um “R” empunhado num silêncio ensurdecedor.
Ontem eu, que sou daqueles que receberam o convite para a estreia, estive do lado de fora, ao lado dos “R” empunhados. Estive não por ser revolucionário nem anarquista, mas apenas porque apesar da “puta da vida” ainda sei bem qual é o meu lugar.
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